Filomena Cautela: "Tinha medo de dar opiniões"

Aos 25 anos, a actriz fala das vitórias e das dificuldades vividas à frente do programa <em>5 para a Meia-Noite</em>, da RTP2.
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Eu acautelo/tu acautelas/ele...

Ele? Acautela? Acautelar é um bom verbo! (risos) Esta é uma boa piada, e olhe que já me fizeram todo o tipo de piadas com o nome.

Acautelar é um verbo que costuma conjugar?

Tenho muito pouca cautela. Gosto pouco de viver com medo. Primeiro, deixem-me cá viver e depois logo vejo com o que tenho e devo acautelar-me. Não costumo conjugar muito o verbo acautelar. Mas há que dizer que Cautela é uma palavra bonita. Não é? É imponente... Tenho as minhas reticências em relação a algumas coisas. Mais do que cautelosa, estou consciente.

Anarquizar, apimentar e endrominar foram apenas alguns dos verbos que deram o "pontapé de saída" a algumas emissões de 5 para a Meia-Noite, na RTP2. Qual o verbo da sua vida?

Viver, na verdadeira acepção da palavra, com todas as coisas boas e más. Não sou ambiciosa, mas vou vivendo e abraçando as coisas.

Como está a correr esta nova experiência televisiva?

O 5 para a Meia-Noite não é um talkshow normal, é um espaço televisivo de humor que se afasta do meu habitat natural. Eu até já fiz algumas coisas, mas a comédia é um género muito difícil de fazer. E eu não tenho a pretensão de ter graça. Leio as coisas e, se acho piada, penso: 'Deixa ver se o pessoal também vai achar.' Se a piada tiver uma mensagem por trás, aí sim, estou no céu! Apresentar o programa está a ser um desafio muito grande, mas no início foi muito conturbado...

Conturbado porquê?

Eu entro logo em dramas. Só pensava como é que iria apresentar aquilo ao lado daquelas quatro pessoas que fazem humor há anos e que sabem fazer tão bem... Acho que nunca dei passos maiores do que as pernas. Nada me foi dado porque tenho umas belas mamas ou uns belos olhinhos... Trabalhei para ter o que tenho. Se há alguma coisa de que me orgulho é de pensar que o sítio onde  estou agora não o consegui pelo meu nome, foi por mim.
Encaixar-se no universo humorístico tem sido o maior desafio?
Sim. Quando me disseram que este ia ser um talk show com cariz de humor, pensei logo que teria de estar rodeada de pessoas que soubessem muito de humor. No início do programa dramatizava muito e falava muito rápido...

Está ao lado de Alvim, Nilton, Pedro Fernandes e Luís Filipe Borges. Aqui que eles não nos ouvem, conte-nos cá: quem é que, afinal, veste as calças lá no estúdio?

(risos) É o nosso director de conteúdos! É engraçado porque no início senti que havia uma certa desconfiança da parte deles em relação a mim, o que é óbvio, porque eles já se conheciam e a mim não. Pensavam, talvez, então, mas esta não é a miúda da MTV e das novelas? Senti isso. 

Fazia falta um sapato alto e um vestido curto no programa? Porquê?

Há muito poucas mulheres a fazer humor em Portugal. O humor é universal, não é uma coisa de homem, tem de se pôr mais mulheres a escrever humor para mulheres e pôr mais mulheres a fazê-lo! Faz falta mulheres com voz na televisão que digam as suas opiniões. Antes deste programa, eu tinha muito medo de dar opiniões.

Tinha? Quer explicar...

As pessoas têm medo de que sejam feitas queixas não sei onde e eu tinha muito medo disso, era muito estúpida. Nós vivemos quanto tempo? 80 anos, no máximo? Quem diz que a minha opinião não é importante? Só não é importante se eu não a fundamentar! Sinto-me militante e, pela primeira vez, em 25 anos deixei de ter medo de o ser. Se achar que as minhas ideias são fundamentadas, no mínimo, vou querer pô-las em discussão, e não vou ter medo disso.

Mesmo que isso traga consequências?

Chegará uma altura em que vou querer ter filhos e, nessa altura,  vou calar a minha boca e alimentar os meus filhos. Até lá, há coisas que acho que fazem falta e uma delas é o diálogo. É importante pôr as pessoas a discutir e se tenho um espaço televisivo...

De onde lhe vem tanta energia? Quando está no ar, fala sem parar...

Sim, eu tenho muita energia! Mas o falar rápido não é nervoseira, é preocupação. Quero aproveitar cada minuto em televisão, quero pôr as pessoas a pensar e, quem sabe, fazê-las não comprar um bilhete para o jogo do Benfica-FC Porto mas, sim, um livro. Vou aqui confessar uma coisa: tenho demasiados amigos que são extraordinários actores mas que vivem da boa vontade dos pais, contam o dinheiro para comer ao fim do dia. O que é que isso me traz enquanto apresentadora do programa? Faz-me ter uma responsabilidade gigantesca e penso que não me posso dar ao luxo de ser uma parvalhona. Então, durante aquela hora quero dizer tanta coisa que fico "blu, blu, blu". Há dias a Teresa Guilherme deu-me um conselho e disse que tenho de perceber que nada é o fim do mundo. Tenho de aprender a dosear as minhas preocupações, respirar e ter calma.

Quem ainda quer ver sentado no vosso sofá branco? Políticos, escritores?

Muita, muita gente. Felizmente ninguém se tem recusado a ir ao programa... Ouvimos, sim, muita gente a pedir para mudarem o horário. Acho que o programa vai começar a ir para o ar mais cedo, mas ainda não sei bem.

Completou na passada quarta-feira mais um aniversário. São 25 anos cheios de...

De trabalho, de vida. Quando faço um flash-back dos meus 25 anos vejo muitas coisas a acontecer. Já estive com milhões de pessoas, em sítios inacreditáveis, fiz coisas inacreditáveis. É um balanço positivo. Aos 25 anos, continua-se com as convicções, mas vão-se perdendo as ilusões. Já não penso em mudar o mundo inteiro, quero mudar só uns bocadinhos.

Nunca lhe conhecemos um namorado. Por algum motivo?

Não é fantástico? Sou muito boa nisso! Se eu fosse conhecida pelas minhas relações  era uma pessoa extremamente infeliz.

Para quando um regresso à ficção nacional?

Estar a fazer o que eu faço dá-me liberdade para poder escolher aquilo que quero fazer em televisão. Agora estou a apresentar, que é uma coisa que eu adoro e que me preenche imenso. Para o ano quero trazer o meu monólogo, Jennis e a Tartaruga, para Lisboa.

Cinco minutos para a meia-noite seria o tempo perfeito para...

(gargalhada) Justamente isso! Não sei, não sei. Tenho vontade de fazer muitas, muitas coisas.

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